Esta semana encontrei um amigo meu de longa data à porta do infantário onde ambos temos as nossas crianças. Conversa puxa conversa, dizia ele, que "o que deviamos fazer era sair à rua em massa e votar em branco" pois os partidos políticos cairam em completa desgraça. Lembrei-me imediatamente de José Saramago e do seu Ensaio Sobre a Lucidez. Num exercício da mais completa lucidez Saramago imagina uma sociedade que em dia de acto eleitoral sai massivamente de casa em direcção às urnas de voto para votar em branco. Não aconteceu, provavelmente, porque teria havido uma concertação societal sobre tal lucidez, mas porque o efeito de composição resultante da opção de cada eleitor, tinha provocado um terramoto na legitimidade do sistema democrático.
Nestas eleições europeias, não sei quantos eleitores votarão em branco, mas são conhecidas as sondagens que apontam para valores na ordem dos 60% em termos de abstenção.
Os partidos estão totalmente desligados da realidade da vida e dos interesses e necessidades das pessoas e as pessoas totalmente de costas voltadas para os partidos. A democracia representativa sofre de uma grave crise de legitimidade.
Perante este estado de coisas, o que sugeriu o iluminado poderoso rei dos Açores, Carlos César, para "proteger" a democracia? Obrigar os eleitores a votarem, tornando obrigatório o exercício do voto. O partido que se diz socialista, é uma autêntica fábrica de cérebros que arrasam a credibilidade da democracia.
Não passou pela cabeça iluminada do Presidente do Governo Regional dos Açores abrir os partidos à sociedade. Não passou pela cabeça de tal mente iluminada, encontrar mecanismos que não afastem os cidadãos mais qualificados dos partidos. Não passou pela cabeça de tal mente iluminada, democratizar o funcionamento interno partidos. Não passou por tal mente inspirada, fazer dos partidos organizações altamente participadas e abertas à critíca democratica. Não passou por tal mente iluminada, os partidos debaterem permanentemente com a sociedade os problemas que influem na sua qualidade de vida.
Não passou pela cabeça de tal mente democrática, os partidos apoiarem-se nas pessoas, nos grupos sociais, nos movimentos sociais, e nas organizações não governamentais, para em conjunto resolver os graves problemas com que a humanidade se confronta. Não passou pela cabeça de tal mente algum raio de sol no sentido de mudar a lei eleitoral por forma a aproximar os eleitores dos seus representantes, ou sequer lhe passou pela cabeça rever a forma como se constroem essas coisas a que os políticos dão o nome de "listas". Não, nada disto ocorreu ao outro rei dos arquipélagos.
Bastaria o voto obrigatório para "proteger" a democracia. Ou mudar de povo, sei lá...
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