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quarta-feira, julho 25, 2007

Ensaio sobre a lucidez: A crise de legitimidade da democracia representativa

Revisitando os resultados das últimas eleições intercalares em Lisboa a mais forte conclusão que um analista não tendencioso pode tirar é a da crise de legitimidade da democracia representativa.

1. Desde logo porque o grande "vencedor" do dia foi a abstenção. Uns largamente preocupantes 63%. Este é sem dúvida o dado socio-político mais significativo.

2. Constatou-se também que os candidatos "dissidentes" dos partidos, os auto-denominados independentes, dos Movimentos "Lisboa com Carmona" e "Cidadãos por Lisboa" de Helena Roseta conseguiram aproximadamente 32% dos votos.

3. O candidato vencedor tem menos votos que os dois movimentos de dissidentes juntos (29,54%).

4. O candidato do PSD fica reduzido à infima expressão eleitoral de 15,74%.

5. Os pequenos partidos, à excepção do Bloco e do PCP que tiveram ligeiras quebras mas cuja tendência é de estabilidade na expressão eleitoral, ficaram reduzidos a pó.

6. Facto extraordinário e relativamente ignorado pelas análises politico-partidárias e mediatico-jornalisticas, a percentagem de votos nulos e em branco atingiu valores de uma expressão assinalável. O total de votos em branco (2,32%) e nulos (1,58%) ultrapassa o total de votos do CDS/PP (3,70%) e o total da soma de votos de todos os pequenos partidos sem representação parlamentar (PCTP/MRPP (1,59%); P.N.R (0,77%); PND (0,71%); MPT (0,54) e PPM (0,38%).
A profecia de Saramago no seu Ensaio sobre a Lucidez teve aqui uma pequena manifestação.

Não há dúvidas sobre o afastamento dos eleitores em relação aos eleitos e dos cidadãos em relação à politica partidária.

A partidocracia reduziu a democracia portuguesa à descrença na política, nos partidos e à capacidade dos mesmos como factor de transformação social da vida dos cidadãos.

O fenómeno é complexo e as causas são múltiplas mas há um factor que é evidente. A prática política dos actuais actores políticos e o fechamento dos partidos políticos sobre si "rebentou" com a legitimidade dos mesmos na condução da vida dos cidadãos.

A política reduziu-se ao económico. São os grandes interesses económicos que traçam o rumo da política económica e social. A política económica deixa pouco ou nenhum espaço para as diferenças que poderiam distinguir direita e esquerda.

A mediatização da vida política e o governo pelas "sondagens" reduziu a política a chavões bons para vender sabonetes, não se discutindo e debatendo as grandes questões de fundo; os políticos tornaram-se profissionais em busca da sua sobrevivência e dos lugares políticos e sociais mais vantajosos para os seus destinos pessoais.

Se há decadas atrás jogar no benfica era a referência de todo o jogador profissional que ali chegava, agora o Benfica é uma rampa de lançamento para os melhores clubes da Europa. A política seguiu os passos do futebol, veja-se o caso Durão Barroso.
A política nacional tornou-se um trampolim para os apetecíveis cargos a nível europeu.

A distância que vai da intriga política, da disputa e trocas de lugares, da visão e da mundivisão dos principais actores políticos em relação à realidade da vida quotidiana e dos problemas dos portugueses é abissal.

O primeiro ministro Sócrates (o tal que detesta os blogues e o que por lá se diz) deu hoje uma entrevista na SIC. É fascinante como a lógica de manutenção do poder faz recusar a realidade que temos pela frente. Entrou-se numa fase é que é preciso ser imune à critíca, em que é preciso acreditar nas suas "verdades" e em si próprio. Dentro em breve tornar-se-á necessário acreditar nas "mentiras" (ponho entre aspas não vá o diabo tecê-las) que se vão auto-produzindo...o pior é que quando isso acontece, é o fim de um ciclo político aquilo que se anuncia...e a seguir virá coisa melhor?

PS: Não quero deixar de dizer para não passar por velho do restelo que a política é a mais nobre das artes...O pior não é a política. São as práticas políticas actuais.

Abraços democráticos

sexta-feira, julho 13, 2007

As consequências económico-sociais da ideologia neoliberal

"O neoliberalismo é o paradigma político definidor da economia dos nossos tempos, tendo como referência políticas e procedimentos que permitem que uns poucos interesses privados controlem o mais possível a vida social, por forma a maximizar o seu lucro pessoal.
Inicialmente associado a Reagan e a Margareth Thatcher, o neoliberalismo foi, ao longo das últimas décadas, a orientação dominante adoptada pelos partidos políticos situados ao centro, por muita da esquerda tradicional bem como pela direita no que se refere a opções de política económica global. Estes partidos e as políticas por eles desenvolvidas são representantes dos interesses imediatos de investidores extremamente poderosos e de umas quantas corporações cujo número não ascende a cem.
À parte alguns académicos e membros da comunidade dos negócios, o termo neoliberalismo é mal conhecido e pouco usado pelo cidadão comum, especialmente nos Estados Unidos. Ali, muito pelo contrário, as iniciativas neoliberais são caracterizadas como políticas de livre mercado, encorajadoras da livre empresa e da liberdade de escolha dos consumidores, premiando a liberdade pessoal e a iniciativa empresarial e destruindo o peso morto que constitui um governo incompetente, burocrático e parasita, o qual nada poderá fazer de bom, mesmo que seja esse o seu objectivo, coisa que raramente acontece.
Toda uma geração de técnicos de relações públicas financiada pelas corporações desenvolveu esforços e conseguiu emprestar a estes termos e ideias uma aura sagrada. Daí resulta que as afirmações que produzem raramente necessitam ser demonstradas, sendo antes invocadas como factor de racionalização que cobre áreas que vão desde a redução dos impostos sobre a riqueza ou o abandono de determinadas regulamentações ambientais até ao desmantelamento de programas de educação pública ou de segurança social.
Na verdade, qualquer actividade que possa interferir sobre o domínio da sociedade pelas corporações torna-se imediatamente suspeita, pois pode interferir com o funcionamento do livre mercado, considerado como o único distribuidor de bens e serviços racional, justo e democrático. No máximo da sua eloquência, os apóstolos do neoliberalismo, enquanto actores por conta de uns quantos endinheirados, surgem como defensores dos pobres e do ambiente e como estando a prestar um enorme serviço à comunidade.

As consequências económicas destas políticas tiveram praticamente os mesmos resultados idênticos onde quer que tenham sido aplicadas: um aumento maçico da desigualdade social e económica; um assinalável incremento da forte depêndencia das nações e dos povos mais pobres do mundo; um desastre ambiental global; uma economia global instável, e uma bonança sem precedentes para os ricos"
Robert McChesney in Chomsky, Noam (1999) Neoliberalismo e Ordem Global. Critica do Lucro.

Neoliberalismo e Ordem Global é um livro a não perder e uma critíca devastadora, daquele que foi considerado um dos maiores intelectuais do séc.XX, às consequências económicas e sociais do neoliberalismo.

E você, já viu passar por aí a ideologia neoliberal?

Abraços e bom fim de semana

terça-feira, julho 03, 2007

Festival MED: Loulé está de parabéns

O seu a seu dono. O festival MED de Loulé no seu quarto ano de existência é um autentico sucesso de promoção e de divulgação cultural. Bem idealizado, bem organizado e com boa qualidade musical.

Aproxima as culturas numa época em que a islamofobia tem tendência a acentuar-se. Apoia-se na diferença, fomenta a interculturalidade, dá a conhecer o que de bom se faz noutras partes do mundo.

Loulé precisava de um evento assim. Aliás, precisava de quatro ou cinco deste género ao longo do ano.

A cultura é crucial ao desenvolvimento económico e social de um povo. Eleva o gosto, desenvolve o espírito, democratiza as oportunidades sociais.

Os cidadãos algarvios sofrem claramente uma forte desigualdade social face ao acesso à cultura comparativamente com as grandes metrópoles do país. Os grandes espectáctulos culturais não vêm à provincia.

O financiamento das actividades culturais é muito insuficiente. O desconhecimento da cultura "erudita" da maior parte da população aumenta as desigualdades sociais face à fruição das obras culturais.

Loulé foi nos primeiros seis meses de 2007 um autêntico deserto cultural. O festival MED foi o canto do cisne da cultura louletana.

Está de parabéns o municipío louletano pela "invenção" deste invento.

Falta agora dar consistência à política cultural da cidade. Sabemos que os recursos são escassos e que a cultura não dá votos mas é também por aqui que se elevam os gostos culturais da população Louletana.

É preciso um maior apoio à criação de clubes de teatro, de música, de leitura, de pintura, etc.
Fazer da vivência da cultura uma forma de vida.
A escola ganharia, os resultados escolares melhoravam e os cidadãos agradeciam .

O público do festival MED vem sobretudo da pequena burguesia citadina, com maior capital cultural que a maioria da população Algarvia.

É preciso arranjar uma estratégia para inculcar o gosto pelas coisas da cultura às populações que mais distanciadas estão da mesma e que se encontram sobretudo nas classes populares.

Só democratizando o acesso à cultura estaremos perante uma verdadeira politica cultural digna desse nome.

Sabemos que não dá votos e que os efeitos só se vêm no longo prazo, mas para isso é que servem os políticos.

Parabéns à organização do festival.