Nove horas e cinquenta minutos do dia 7 de Junho de 2009. Acabo de cumprir o meu direito e meu dever de voto. A velha Escola Primária dos tempos de Salazar está deserta. Numa sala de aula, muito semelhante àquilo que ao longo das minhas dezenas de anos de eleitor tenho encontrado, coloco uma cruzinha no partido que acho merecer a minha confiança. Não custou nada. A decisão estava tomada há muito tempo. Foi um voto à esquerda como não podia deixar de ser. Um voto de protesto, sim, de certeza absoluta, mas também um voto de confiança no partido e nos candidatos que considero verdadeiramente defenderem os interesses dos cidadãos portugueses e europeus.
Nutro um sentimento de dever cumprido, em honra a todos os que lutaram historicamente pelo direito de voto, mas em simultâneo, existe em mim, um grande sentimento de impotência e frustração.
Os partidos do pasteloso centrão, a direita de Sócrates e Vital e de Ferreira Leite e Rangel, estão de acordo em eleger Durão Barroso para presidente da Comissão Europeia.
O rosto de Durão Barroso é (conjuntamente com Sócrates que presidiu a União Europeia seis meses) um dos grandes responsáveis pela grave crise económica e social que hoje atravessamos.
Foram políticas deliberadamente levadas a cabo e seguidas por políticos, no sentido da desregulamentação dos mercados financeiros, da privatização do impensável social, do desmantelamento do Estado Providência, da desregulamentação das relações de trabalho e da legitimação da precariedade laboral (houve uma proposta no sentido de legalizar as 60 horas de trabalho!!!), da destruição dos serviços públicos (a directiva Bolkenstein), para não falar em muitas outras predadoras políticas, com destaque para o apoio de Barroso, na qualidade de presidente da Comissão Europeia, à invasão do Iraque, sustentada na "mentira do século" que foram as imagens das armas de destruição massiva que afinal nunca existiram, que levaram o mundo económico a entrar colapso. A "directiva de retorno" que está a levar à criminalização dos emigrantes ilegais é outro retrocesso civilizacional e o reflexo desta bárbara política.
Foram políticas e políticos senhores, não foi obra e graça do espírito santo, nem sequer a "culpa" foi dessa entidade reificada, sem rosto, a que hoje se chama "globalização" que originaram o monstro que é a actual "crise".
Por isso me sinto altamente frustrado. De nada serve o meu voto na esquerda. A esquerda que afinal é de direita, a de José Sócrates legitima tudo o que de pior se faz em política e de injustiça social. A esquerda que afinal é de direita, caminha tranquilamente para o suicídio sem saber que o faz.
Soares, quase no fim da sua vida, ainda teve a lucidez (como quase sempre) de se unir a vários socialistas europeus para pedir aos socialistas europeus que não apoiem Durão Barroso.
Não vai servir de nada. Para a esquerda, que afinal é de direita, de Sócrates, é vital votar Barroso. As "carreiras" europeias, ou as "carreiras" nas grandes empresas privadas são mais importantes que a política e os interesses e necessidades dos povos europeus.
A culminar a hipocrisia dos partidos do pastoso centrão, apela-se hoje em dia ao voto com base na terreola dos candidatos. Devemos apoiar Durão Barroso porque é um bom sacana português e votar em Jamila Madeira porque é uma porreira Louletana. O bairrista José Vitorino, em Faro, afinal tem carradas de razão. Votem em mim, porque eu sou de Faro. Ainda bem que Hitler não é hoje vivo, ou Stalin, ou Salazar. Com estes bons argumentos era o bom e o bonito. Como eu compreendo a Dona Abstenção. Eu quero ter o direito a votar no presidente da Comissão Europeia. Será que esse dia está para breve?
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