Costuma-se dizer que a memória é a alma de um povo. Povo sem memória é como peixe sem água, carteira sem dinheiro ou mesmo comboio sem linha de ferro. Memória e esquecimento são um par de conceitos que não vivem um sem o outro. Sem memória mais não resta que o esquecimento. Com o esquecimento é a memória que se foi à vida.
É assim que se decide preservar o património arquitectónico de uma cidade pois este faz parte da "memória da colectividade". É assim que se apela à "memória histórica" para recordar os valores fundamentais de uma dada sociedade ou cultura. É assim que nos insurgimos contra a destruição da "memória", quando consideramos que ao cair no esquecimento, é uma parte de "nós", comunidade, que corre o risco de desaparecer.
Mas a memória é também fulcral na nossa existência como indivíduos. O nosso bilhete de identidade está aí para nos recordar persistentemente do nome que nos dá existência. Apontamos na agenda as datas de aniversário dos nossos "entes queridos" para não corrermos o risco de nos "esquecermos" deles. Fazemos o curriculo vitae para nos apresentarmos e apresentarmos o que somos capazes de fazer e é bom que não nos esqueçamos de nada pois todo o nosso passado "meritório" pode fazer a diferença. O resto, o melhor é fazer por esquecer.
A memória é também extremamente egoísta e selectiva. Lembramo-nos mais daquilo que nos dá jeito lembrarmo-nos e esquecemo-nos rapidamente daquilo que não é conveniente memorizar. Há coisas na memória que caiem no esquecimento para sempre. Há outras que ficam arquivadas no baú e que vêm ao de cima com um cheiro, um sabor, um acontecimento. E há esquecimentos que são isso mesmo, esquecimentos, e que nunca mais vêm à memória.
Não me lembro de certeza do que almocei há uma semana exactamente atrás mas lembrar-me-ei com precisão do dia em que nasceu o meu primeiro filho. Não me lembro do dia em que fiz a primeira comunhão mas lembro-me de certeza do dia 11 de Setembro de 2001, dia, em que a memória, rebentou, com o esquecimento.
Memória e esquecimento são pares complexos, indissociáveis e que se excluem mutuamente. Quando não há memória, há esquecimento. Quando há esquecimento é porque se foi a memória.
No caso Freeport, ganhou o esquecimento à memória. No caso BPN, a memória perdeu para o esquecimento. A memória e o esquecimento também dão muito jeito sempre que o homem quer. Por vezes a memória empurra o esquecimento e por vezes o esquecimento empurra a memória. E você, caro leitor, lembra-se do que almoçou na semana passada?
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