Na altura do encerramento da fábrica da Unicer escrevi um post em jeito de pronúncio do destino dos trabalhadores à época "dispensados". Volto a relembrá-lo no sentido de pedir a vossa ajuda para saber se alguma coisa não bateu certo com a profecia que aqui fiz. Cá fica de novo o post então:
A globalização económica dentro de casa e o fecho da UNICER
"A globalização económica, hegemónica e neoliberal é assim. Cega, movida exclusivamente pelo valor mercadoria e ansiosa por expandir continuamente a acumulação de capital. Desta vez foi mesmo aqui dentro de casa. O Centro de Produção da UNICER de Loulé vai fechar portas e deslocalizar para outras bandas, onde as vantagens comparativas sejam maiores e as mais valias sejam crescentes. O problema é que se o capital é global, o trabalho ainda não o é e o drama dos trabalhadores e das suas famílias fica connosco ao lado da porta.
O filme já é conhecido e a tragédia é sempre a mesma. De início os trabalhadores resistem, tentam por tudo que a empresa não feche portas, até que o tempo e o desencanto os faz perder as energias. Alguns deles vão procurar soluções individuais, procurando novo trabalho, outros, cairão na categoria de desempregados de longa duração e talvez alguns deles procurem soluções na formação profissional de reconversão, à espera de melhores dias.
Os sindicatos vão estrebuchar e pouco poderão fazer. A sua força já é de outros tempos. As autoridades vão fazer o que podem, mas o que podem é muito pouco. A justiça, como sempre, vai demorar anos a dar o seu veredito, até que um dia os trabalhadores tenham a sua justa indeminização. Quando os Farrajotas faliram, os tribunais demoraram 14 anos a repôr a justiça face aos direitos dos trabalhadores. Catorze anos depois, quando a indeminização devida chegou, alguns trabalhadores estavam à beira da morte, ou já teria passado o período mais enérgico das suas vidas.
O neoliberalismo reinante, que João Cravinho, na revista Visão desta semana, diz reinar em Portugal há várias décadas e que se intensificou claramente com o governo actual, é predatório face aos menos poderosos, cego face aos direitos dos cidadãos e dos trabalhadores e soberano face ao poder político. Enquanto o poder político for um mero prolongamento dos poderes económicos dominantes nenhuma Unicer poderá por cá ficar.
Marx já tinha avisado, a lógica expansiva do capital é a da busca incessante do lucro. Seja nas Quatro Estradas, em Angola, na China, no fundo do mar da Noroega, ou em Marte. Só uma globalização mais justa e solidária pode alterar estas lógicas predadoras. E isso não vai mudar de um dia para o outro. É importante que os governantes e os empresários locais, ajudem à reconversão profissional destes trabalhadores e não os encarem como um mero exército de reserva do sistema capitalista global."
Quase um ano depois da fábrica ter encerrado e de termos escrito este post, somos informados pela imprensa nacional, que dos 57 trabalhadores da Unicer, dois foram integrados em Santarém, seis estão em programas ocupacionais, cinco estão a trabalhar, e os restantes 44 continuam no desemprego.
Acompanhe mais desenvolvimentos desta notícia em:
http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1319509
Os políticos lamentaram-se, o IEFP accionou as suas melhores respostas burocráticas, as empresas não querem saber dos trabalhadores da Unicer e a Unicer não quer saber dos seus ex-trabalhadores.
O Deus Mercado reduz a política e os políticos a meros servos do sistema capitalista global. O governo dos homens foi substituído pela administração das coisas. Não foi Marx que sonhou com isto?
PS: Faça como eu...beba Boémia...
Num artigo publicado no Jornal de Negócios Baptista Bastos começava-o com uma afirmação do sociólogo francês François de Singly, professor na Sorbonne: para que abismos caminha o capitalismo?"
ResponderEliminarPergunta pertinente porque na verdade o capitalismo actual representa uma verdadeira ameaça para a humanidade. A preocupação cada vez maior com o lucro leva a que os trabalhadores sejam cada vez mais explorados. Para isso são criadas leis cada vez mais flexíveis na questão dos despedimentos, de horários e de número de horas de trabalho. Isto porque quem não é rentável do ponto de vista do capitalista não tem direito ao trabalho. E não basta o lucro por si só mas sim obedecer a determinadas normas de rentabilidade que cada vez são mais exigentes.
E, o capitalismo, não satisfeito com a exploração cada vez maior dos trabalhadores, tenta, e está conseguindo, tirar benefícios na saúde, educação, formação e cultura. O Portugal de José Sócrates é um bom exemplo do que acabo de escrever...
Comentários para quê? -VÓS QUE LÁ DO VOSSO IMPÉRIO -PROMETEIS UM MUNDO NOVO, -CALAI-VOS, QUE PODE O POVO -Q`RER UM MUNDO NOVO A SÉRIO. A. Aleixo
ResponderEliminarNa sequência da quadra de António Aleixo, acima publicada, nada melhor que um poema de Sophia de Mello Breyner Andresen:
ResponderEliminarCOM FÚRIA E RAIVA
Com fúria e raiva acuso o demagogo
E o seu capitalismo das palavras
Pois é preciso saber que a palavra é sagrada
Que de longe muito longe um povo a trouxe
E nela pôs sua alma confiada
De longe muito longe desde o início
O homem soube de si pela palavra
E nomeou a pedra a flor a água
E tudo emergiu porque ele disse
Com fúria e raiva acuso o demagogo
Que se promove à sombra da palavra
E da palavra faz poder e jogo
E transforma as palavras em moeda
Como se fez com o trigo e com a terra.