"O nosso insucesso sanitário é um escândalo. Apesar dos rios de dinheiro gastos a limpar águas , estão cada vez mais sujas.
O saneamento é uma eterna falsa partida. E não só falsa. É também uma "partida" que nos pregam que não tem graça nenhuma. A opinião pública desinteressou-se com enfado desta história deprimente que, de tão repetida, perdeu já a mais básica capacidade de indignar. E, contudo, o saneamento é uma meta básica que na última dezena e meia de anos já sorveu milhões de escudos e euros e cujos resultados não param de regressar ao agravamento.O pior é que os problemas do saneamento básico em Portugal, ao viverem numa incompetência e impunidade tão grande durante tanto tempo, acabaram camuflados pela sua própria evidência. Que as águas se degradem na razão directa das fortunas que se gastaram a assegurar-lhe a qualidade, tornou-se uma banalidade. Mas não deixa por isso de continuar a ser um escândalo.
Como é que isto tudo aconteceu? Desde os anos 60, Portugal assistiu a um acelerado e caótico processo de desordenamento do território. Os factos são conhecidos: macrocefalia urbana e sobretudo suburbana, litoralização, construção clandestina dispersa, instalações fabris mais ou menos artesanais espalhadas por todo o lado, e até grandes complexos industriais dispensados magestaticamente de quaisquer precauções sanitárias (...).
(...) Vejamos os factos. O primeiro Quadro Comunitário de Apoio (QCA), entre 1986 e 92, injectou 1.100 milhões de euros no saneamento básico. Pouco tempo depois. o fracasso manifestou-se de forma mais grotesca: construiram-se ETAR a vazar ou para sítio nenhum, ou desligadas da própria rede de esgotos; construiram-se ETAR que para nada serviam, despejando novamente para o domínio público a carga que supostamente deviam tratar. Outras que apodreceram sem nunca terem chegado a funcionar; ou que entupiram ao primeiro ciclo de funcionamento. O ridículo tornou-se arrepiante. No 2º QCA, em 1993-1999, a situação começou a ser denunciada. Vieram então mais 490 milhões de euros. Todavia, retomaram-se as mesmas asneiras de antes.
A então Direcção Geral do Ambiente, responsável nessa altura pela boa aplicação dos fundos, continuou a não fiscalizar a eficácia dos investimentos. Chegou-se a tal ponto que, em finais de 1995, um estudo do LNEC, coordenado por Jaime Melo Batista e Rafaela Matos, traça um quadro assustador da nossa segunda "esforçada" tentativa para sair da chafurda: 91% das ETAR existentes não funcionavam bem, sendo que 68% funcionavam mesmo muito mal...O estudo também diagnosticava a falta de planeamento; a má concepção técnica; as tecnologias desadequadas; a ausência de uma entidade que fiscalizasse a situação; a falta de formação técnica dos operadores camarários."
In Luísa Schmidt, País (In) Sustentável. Ambiente e qualidade de vida em Portugal, Lisboa, Esfera do Caos, 2007
E nós por cá, tratamos das nossas Estações de Tratamento de Águas Resíduais?
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