Podia ter sido eu. A praia da Maria Luísa foi até há alguns anos atrás a minha praia de eleição. Horas e horas de quentes tardes de Verão passei eu há sombra daqueles belos rochedos. Até há muito pouco tempo não havia sinalização alguma de aviso. Mas também é lógico que um cidadão avisado não se deveria expôr ao risco. Acontece que vivemos em sociedades de risco. E é às autoridades públicas que em primeiro lugar compete a gestão e a prevenção do risco.
Desde a década de sessenta do século anterior que o país se deslocou para cima do mar. O progressivo processo de urbanização e de litoralização resultante daquilo a que chamamos desenvolvimento e a que normalmente confundimos com crescimento, originou o mais caótico desordenamento do território.
Não há duna, arriba, ou outro ponto da costa com vista para o mar que não tenha uma boa dose de cimento em cima. O governo da nação e em especial, as autarquias e os autarcas, omitem com indiferença as suas responsabilidades na não gestão da costa portuguesa e permitem escandalosamente o enriquecimento de uns poucos em detrimento da defesa do interesse público, o mesmo é dizer, do interesse de todos nós.
Se o air du temps de há duas décadas atrás permitia a construção desordenada e desenfreada em cima da costa litoral, e esta poderia ser justificada com a alegada ignorância ambiental; nos dias de hoje, à luz de um contexto de época em que as alterações climáticas assumem contornos de verdade globalizada e inconveniente; à luz de uma miríade de intrumentos legais que procuram regular a gestão costeira; só a incúria, a falta de responsabilidade e há que dizê-lo com coragem, em muitas situações, a corrupção, de quem deveria gerir os bens públicos, pode permitir que se continue a assistir a licenciamentos de construção em cima de dunas e arribas costeiras.
Depois, na hora da tragédia, as autoridades ditas competentes procuram legitimar-se desculpando-se e refugiando-se nas causas naturais. São os sismos, é a força do mar, são os ventos costeiros. As causas, essas são bem mais complexas. E bastantes vezes, está lá a intervenção humana. Podia ter sido eu. Seria eu o irresponsável.
Leiam o que escreveu o Luís Brás da Almargem. É que a incúria é por ele bem denunciada.
Ver aqui a posição do Luís Brás da associação ambientalista Almargem: http://almargem.org/images/articles/130/NI0908PraiaMariaLuisa.pdf
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