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quarta-feira, janeiro 30, 2008

O dia do aniversário da cidade como instrumento de propaganda política

1. A comunicação política não pode substituir a política que verdadeiramente influência a vida real das populações.

2. Deve o dia do aniversário da cidade servir para cortar fitas, assinar protocolos, autos de consignações e anúnciar obras públicas e requalificações ainda por fazer?

3. Estaremos perante meras estratégias de comunicação da política ou perante um poderoso aparelho de propaganda com a conivência de alguns meios de comunicação social locais?

4. Estarão as agências de comunicação tão do agrado do dr. Filipe Menezes já altamente profissionalizadas também em Loulé?

5. Não estaremos perante estratégias subtis de "manipulação" (ponho entre aspas não vá o diabo tecê-las) dos cidadãos locais com o objectivo de retirar vantagens eleitorais futuras?

6. E se comemorássemos o aniversário da Cidade com eventos culturais que envolvessem a participação dos cidadãos?

São questões que deixo para reflexão sobre a política cá do burgo.

Para aqueles com mais paciência para os meus "enfadonhos" textos deixo-vos um artigo do António Barreto escrito no Público do último Domingo intítulado "A Arte de Mentir"

A arte de mentir

Por António Barreto

TÊM VÁRIAS DESIGNAÇÕES. Assessores. Conselheiros. Encarregados de relações com a imprensa. Agentes de comunicação. Ou, depois do choque tecnológico, Press officers e Media consultants. Sem falar nos conselheiros de imagem. Povoam os gabinetes dos ministros, dos secretários de Estado, dos directores gerais, dos presidentes e dos gestores. Vivem agarrados aos telemóveis, aos BlackBerries, às Palms e aos computadores.

Falam todos os dias com os administradores, directores e jornalistas das televisões, das rádios e dos jornais. Dão, escolhem, programam e escondem notícias. Mostram aos políticos e aos gestores o que é do interesse deles. Planificam a informação. Calculam os efeitos e contam as referências feitas na imprensa. Tratam da imagem, compram camisas para os seus mestres, estudam-lhe as gravatas, preparam momentos espontâneos, formulam desabafos, encenam incidentes e organizam acasos. Revelam a intimidade que se pode ou deve revelar.

Calculam os efeitos negativos de uma decisão sobre os impostos, que articulam com as consequências positivas de um aumento de pensões. A fim de contrabalançar, colocam o anúncio de Alcochete logo a seguir ao do referendo europeu. Fazem uma planificação minuciosa das inaugurações. Escrevem notícias com todos os requisitos profissionais, de modo a facilitar a vida aos jornalistas. Mentem de vez em quando. Exageram quase sempre.

Organizam fugas de imprensa quando convém. Protestam contra as fugas de imprensa quando fica bem. Recompensam, com informação, os que se conformam. Castigam, com silêncio, os que prevaricaram. São as fontes. Que inundam ou secam.

OS JORNAIS PARECEM-SE UNS COM OS OUTROS. As notícias são quase iguais. As agendas das redacções são gémeas. Salva-se, desta uniformidade, aqui e ali, quem assina o que escreve. Os noticiários das televisões têm agendas iguais. E alinhamentos de notícias também. Os directos, grande vício da televisão portuguesa, são iguais em todos os canais.

Cada vez mais, a informação está previamente organizada, não pelas redacções, não pelos jornalistas, mas pelos agentes e pelos assessores. Quem tem informação manda em quem investiga, escreve e transmite. Grande parte da informação é encenada e manipulada, de acordo com as conveniências.

Há informação reservada para melhores momentos, informação programada para dramatizar, informação inventada para divertir e informação acelerada para consolar. Isto acontece há anos. Em Portugal e no mundo inteiro. Todos os anos, a situação piora. Com Sócrates, refinou. O poderio das organizações de comunicação é avassalador.

A opinião pública não tem meios para escolher e resistir. Só a independência dos jornalistas poderia fazer frente a este domínio inquietante. Mas esta é um bem raro. Até porque os empregos na informação são cada vez mais precários.

A RECENTE POLÉMICA SOBRE AS AGÊNCIAS DE COMUNICAÇÃO, novo episódio numa longa série, mostrou esta actividade no seu pior. As mesmas agências comunicam a favor dos adversários, da política e da economia, da polícia e do ladrão, do governo e da imprensa. Do atirador e do alvo, como disse Pacheco Pereira. Até a Entidade Reguladora para a Comunicação, sem ver os efeitos nefastos, achou por bem ter uma agência a tratar da sua informação.

O governo tem a sua. Luís Filipe Menezes também: em vez de denunciar a prática do governo, quis imitá-lo. Foi preciso Santana Lopes, em momento inspirado, opor-se a este despotismo: “O modo e o conteúdo da comunicação fazem parte do domínio da liberdade absolutamente inalienável de cada deputado”.

LUÍS MARQUES, JORNALISTA HÁ VÁRIAS DÉCADAS e com experiência da redacção, da direcção e da gestão da informação, em jornais e na televisão, fez há poucos anos um pequeno estudo sobre as “agendas” de informação. Chegou a resultados surpreendentes. Contando apenas os grandes órgãos de informação generalistas e nacionais, com exclusão das secções mundanas e outras, havia em Portugal cerca de 1.500 profissionais.

Para os alimentar de informações, os assessores, as agências de comunicação e outros somavam quase 3.000. Quer dizer, por cada jornalista em actividade na informação política e económica, dois profissionais preparavam as agendas e as notícias. É esta gente que inunda as redacções com “factos”, “eventos”, “oportunidades” e “situações”.

Qualquer redacção tem dificuldade em resistir-lhe. Se, às 20.00 horas, o Primeiro-ministro sai de um lar de idosos, entra numa creche ou produz uma declaração espontânea, como pode uma redacção decidir não estar presente? É este exército o responsável por grande parte das “entradas” que, durante a manhã, enchem as agendas das redacções. Num grande canal de televisão, essas entradas podem hoje chegar às 1.000 por dia, enquanto eram cerca de 100 há quinze ou vinte anos.

Na agenda diária da redacção de um canal de televisão, perto de um terço das entradas (mais de trezentas...) é feito directamente pelas agências de comunicação e pelos assessores dos gabinetes e das instituições. Mais ainda, é aquela brigada que, muitas vezes, sobretudo na informação económica, redige as notícias.

Nas redacções, povoadas hoje por jovens estagiários e inexperientes, mas também por seniores preguiçosos, publicar directamente as notícias assim preparadas, ainda por cima por jornalistas e antigos jornalistas treinados, é a solução mais simples. Por isso, é frequente vermos, sem menção de publicidade, notícias económicas absolutamente iguais em vários jornais.

HÁ QUEM PENSE QUE É ISTO A MODERNIDADE. A informação racional da época contemporânea. O sinal da eficácia. O instrumento da transparência. Mas desenganem-se os crédulos. O objectivo dos assessores e das agências de comunicação é sempre o de defender os interesses do autor da informação, nunca do destinatário, do cidadão.

A única preocupação do agente é a de vender o mais possível, nas melhores condições, bens ou ideias, mercadorias ou decisões. Os agentes de comunicação não defendem os interesses dos compradores, dos consumidores ou dos espectadores, mas tão só dos vendedores, dos produtores e dos autores.

Apesar de pagos pelos eleitores, servem para defender os eleitos. Este é o mundo em que vivemos: a mentira é uma arte. Esta é a nossa sociedade: o cenário substitui a realidade. Esta é a cultura em vigor: o engano tem mais valor do que a verdade.
«Retrato da Semana» - «Público» de 27 de Janeiro de 2008

O regresso em força da propaganda à política. E nós por cá? Era bom que andassemos de olho aberto.

Bom Carnaval.

3 comentários:

  1. Sem dúvida, o príncipe só sai à Rua quando pode reunir os súbditos.
    Aparece em dias convenientes para o banho de aplausos e recolhecer para desinfecção o resto do ano.
    O Príncipe mistura-se, apenas em terrenos conhecidos e em clima festivo!
    Como o próprio Luis XIV, é o príncipe que prepara,abre e encerra a Festa...

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  2. "E se comemorássemos o aniversário da Cidade com eventos culturais que envolvessem a participação dos cidadãos"?!!!
    Isto pode ser... muito perigoso!
    Quem define na CML o que é cultura?
    Amigo João Martins, por acso não é um tal "guerreiro", chefe de Gabinete de Comunicação, Relações Públicas e Eventos da CML, que indicou num artigo na Voz de Loulé, aqui há cerca de um ano ou dois, que o espectáculo porno-escatológico «Levanta-te e ri», que ele trouxe até nós, fora um evento cultural?
    Imagine-se, por este exemplo, o que poderá ser um evento cultural imaginado por tal crâneo para comemorar a elevação de Loulé a cidade!...

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  3. José Carlos, compreendo os seus receios. É importante não confundir a cultura que pode elevar os gostos culturais da população do concelho, com o "circo" para o povo. O que digo é que não me parece boa altura para corta-fitas e outros que tais...que numa interpretação menos ingénua, deixa sempre no ar a suspeita de propaganda política e estratégia eleitoral como pano de fundo.

    Preferia a cultura...música, dança, teatro, ópera, pintura, cultura popular...algo que ligasse os cidadãos ao aniversário da sua terra.
    Bom carnaval e bom trabalho para o Calçadão

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