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quinta-feira, janeiro 24, 2008

Os meninos obedientes e o retrocesso da democracia local à escala nacional

Existe um ethos antidemocrático nalgumas das elites que nos governam que se traduz em medidas legislativas que são um claro retrocesso para a democracia portuguesa.

Os ideais de governação, tais como, o reconhecimento da pluralidade de opiniões, a diversidade de representação dos vários interesses societais, a negociação política como forma de construção das decisões, são postos de lado por esta tecnocracia bem pensante, com custos dramáticos para as práticas democraticas que procuram fomentar a cidadania através da participação dos cidadãos.

Deixo-vos com mais uma opinião contracorrente, das poucas que ainda vão tendo acesso às páginas mais ocultas dos jornais nacionais e que vale a pena ler para reflectir sobre os efeitos antidemocráticos da nova lei eleitoral para as autarquias locais

Jornal Público de 23 de Janeiro de 2008;

O artigo intitula-se "Chapelada eleitoral" e é de autoria de António Vilarigues.

"O que se pretende é afastar da vereação de 87 % dos municípios portugueses os representantes dos partidos da oposição.

Os deputados da nação eleitos nas listas do PS e do PSD cozinharam, a toque de caixa, os mecanismos que vão permitir nas eleições autárquicas de 2009 uma tremenda chapelada eleitoral.

Ao fazê-lo revelam-se "meninos" obedientes de José Sócrates, Luís Filipe Meneses, Alberto Martins, Santana Lopes e tutti quanti. O pretexto é uma mentira esfarrapada, uma descarada aldrabice. A dita falta de "estabilidade governativa" das autarquias. Só que a realidade, essa "chata", aí está para os desmentir sem apelo nem agravo.

Desde o 25 de Abril de 1974, realizaram-se em Portugal por nove vezes eleições para as autarquias. Todas com o actual sistema eleitoral. Salvo erro ou omissão, nunca, em 31 anos de poder local democrático, um executivo camarário caiu por estar em minoria. O caso recente da C.M. de Lisboa, como é sabido, foi por opção própria do PSD.

Existem 308 câmaras municipais. Com base nos resultados das eleições de 2005, apenas 13 %, ou seja, 42, são governadas por maiorias relativas. Onde os problemas de funcionamento, em geral, se têm resolvido pelo conhecido e democrático método da negociação política. As outras, 87%, isto é, 266, são de maioria absoluta.

Onde está pois a "falta de estabilidade"? Acresce que só num país politicamente muito doente é que os dois maiores partidos (PS e PSD) podem defender que as maiorias absolutas são um quase insubstituível pilar da democracia. Na verdade, acordos, negociações, coligações e entendimentos entre diversas forças políticas têm, ou deviam ter, igual dignidade e naturalidade democráticas.

O que está, de facto, em causa nesta legislação não é tanto o garantir na secretaria maiorias absolutas. O que se pretende é afastar da vereação de 87 % dos municípios portugueses os representantes dos partidos da oposição.

PS e PSD enchem a boca com loas à participação dos cidadãos e à proximidade entre eleitos e eleitores. Não deixa de ser elucidativo que lhes neguem logo à partida o simples e inalienável direito de, com o seu voto, poderem escolher aqueles que melhor os representem.

Uma questão exige resposta clara. O número de vereadores do executivo é atribuído com base em quê? A resposta só pode ser uma - nos votos recebidos pelos partidos, coligações ou listas de cidadãos. Caso contrário, poder-se-ia afirmar que tinha acabado a democracia.

Como muito correctamente aqui escreveu Vital Moreira (2005/06/25), "(...) a eleição conjunta (câmara e AM) implicaria a natural "bipolarização" não somente na eleição do presidente da câmara municipal, garantindo, na maior parte dos casos, uma maioria fiel e obediente ao presidente, tanto mais que o candidato a presidente se encarregaria de controlar a composição da lista a que ele próprio irá presidir".

E mais adiante:"A ameaça à democracia municipal desta proposta de reforma está na inaudita concentração do poder nas mãos do presidente da câmara e na domesticação das assembleias municipais".

Não podíamos estar mais de acordo. PS e PSD, a direita dos interesses, querem-nos impingir uma concepão antidemocrática da gestão das autarquias. Que acentuará inevitávelmente o carácter unipessoal e presidencialista da governação camarária. Reduzindo ao mesmo tempo a sua colegialidade e transparência. Depois disso, ainda se poderá falar em "poder local democrático?"

Concordam com o António Vilarigues? Eu assino por baixo.

Os gémeos partidos do centro podem bem invocar a "responsabilidade" de quem governa, as "boas" práticas de gestão, uma maior "eficiência" e "eficácia" da governança, que o espírito da lei para as autarquias, aquilo que revela é uma concepção profundamente antidemocrata da vida social.

E nós por cá em Loulé? O PS, sorrateiro, silêncioso, seguidista das orientações do partido, obedecendo a lógicas que os interesses das populações e da democracia desconhecem, vão consentindo o retrocesso da democracia local.

O PSD, calado, esfregando as mãos, olha para o aniquilamento das oposições como uma dádiva dos deuses e como uma oferenda nacional para o reforço do já majestático poder do príncipe.

E os restantes cidadãos? Alguns alheados, outros, um pouco mais atentos, mas impotentes face a tais arruaças democráticas, outros revoltados e sem poder de intervenção, comum a todos eles, o aumento do divórcio face aos políticos e aos partidos nacionais.

Triste política e frágil democracia. Resta-nos a "realidade", que é sempre mais "chata" do que aquilo que queremos fazer com ela. E quando não se pode mudar de governo, resta a solução de mudar de povo. Restará?

Abraços democráticos

3 comentários:

  1. Caro João Martins:
    Tomei a liberdade de transcrever este seu post no 'Calçadão'. Ao contrário do que é habitual na nossa equipa, não foi possível informá-lo do facto através de e-mail pela simples razão de que não descobri o seu endereço.
    Se o João Martins entender que o 'Calçadão' não deveria ter transcrito o seu post, basta que nos envie um e-mail nesse sentido e retirá-lo-emos de imediato.
    Com os nossos cumprimentos amigos.

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  2. Caro José Carlos;

    De que servem as palavras se elas não circularem pelas pessoas?

    Se servir para levar mais gente a pensar nestas coisas...que faça bom proveito!

    Agradeço a visita. Cumprimentos ao Calçadão.

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  3. Com apenas um ano de existência o blog 4TheKids tornou-se num ponto de passagem obrigatória para todos os fãs da música hardcore em Portugal! De modo a celebrar esse aniversário a equipa do 4TheKids propôs-se um objectivo: lançar de forma gratuita na Internet uma net tape com 12 temas de 12 bandas nacionais, um tema por cada mês de vida do 4TheKids.

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