O caso da turbolicenciatura de Miguel Relvas tem a maior revelância política, entre outros motivos, pelo facto do Governo de Pedro Passos Coelho ter atacado de forma indecente o Programa Novas Oportunidades, descredibilizando-o e pelo facto do novo arauto do ensino do antigamente, o Ministro Crato, fazer todos os dias a elegia do rigor, do mérito e da busca da excelência como princípios base do sistema de ensino. Se queriam melhor exemplo de facilitismo, olhem para a trajectória académica de um dos mais poderosos ministros do governo do qual Crato faz parte.
O processo de reconhecimento, validação e certificação de competências no âmbito das Novas Oportunidades basea-se numa filosofia de educação e formação de adultos. Trata-se de reconhecer que se aprende fora da escola, nos mais diversos contextos de socialização e em simultâneo que esses adquiridos experenciais podem ser objecto de produção de competências. Tem como suporte desta filosofia um conjunto de metodologias e de técnicas que permitem reconhecer competências. Um referencial de competências-chave, uma autobiografia, metodologias de balanço de competências, a produção de um portfólio reflexivo de aprendizagens, a necessidade do reconhecimento e da validação de competências adquiridas ao longo da vida pelos próprios que passam pelo processo com o auxilio do suporte técnico de pessoal altamente especializado. O caso da licenciatura de Miguel Relvas em nada se assemelha a isto. É um verdadeiro embuste. Uma fraude que deve ser bem investigada do ponto de vista policial de modo a que se esclareça como foi produzida esta certificação e de modo a que não se defraudem as expectativas de milhares de estudantes que com muito sangue, suor e lágrimas conseguem seriamente tirar os seus cursos.
E a fraude resulta no facto de Relvas não ter passado por um verdadeiro processo de reconhecimento e validação de competências que permitisse perceber que a sua experiência de vida se traduziu verdadeiramente em competências adquiridas. Por exemplo, não basta conviver com as elites políticas e empresariais para que isso automaticamente se traduza numa equivalência à cadeira de Classes Sociais, Elites e Lobbies. Nós sabemos que Relvas é perito na fabricação de Lobbies, mas até que ponto Relvas conhece e distingue a teoria das classes sociais de Marx e é capaz de a diferenciar da de Max Weber? Até que ponto é capaz de identificar a diferença nos pressupostos em que se baseam as abordagens funcionalistas das classes sociais das abordagens neomarxistas? Leu Miguel Relvas Pierre Bourdieu e é capaz de expôr a sua proposta de conceptualização do espaço social? E será capaz de operacionalizar empíricamente uma qualquer proposta tipológica dos lugares de classe na sociedade portuguesa de modo a poder estudar uma qualquer questão relacionada com as desigualdades sociais? Leu e conhece a teoria das elites de Charles W. Mills ou de Pareto?
Basta ascender socialmente através das jotinhas para que este conjunto de saberes lhe seja reconhecido? Foi feito um trabalho de reconhecimento que permitisse a Relvas demostrar competências deste tipo? A resposta é conhecida. A licenciatura de Relvas é um certificado à ignorância. Não premeia o mérito. É o mais puro exemplo do facilitismo e é repugnante para quem como eu tem milhares de horas de estudo e trabalho em cima com muito sacrifício em detrimento de família e amigos para afinal constatar que tudo vale neste país e nem o ministro se demite, nem Nuno Crato se pronuncia, nem Passos Coelho o põe na rua. Uma fraude. Uma pura trafulhice. A propósito, a minha sogra voltou a reinserir-se no mercado de trabalho graças às Novas Oportunidades. Obrigado José Sócrates.
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