O Rui veio hoje pedir uma moedinha como é da praxe. Não sei para que serve nem isso me interessa. Sei que ele pede e eu não sei como dizer que não. Hoje disse-lhe que estamos os dois na maior miséria. É obvio que a miséria do Rui é muito mais indigna que a minha. Eu ainda não passo fome, só tenho a minha dignidade vandalizada. Perguntei-lhe onde está a dormir ao que me esclareceu que há uns bons dias que está a dormir na rua, logo ali, em pleno centro de Loulé, junto aos antigos correios. Tapa-se com uma mantinha, conforme me disse. Perguntei-lhe sobre a comida. Diz que se desenrasca, como sempre. O banho parece que há por aí uns balneários abertos onde põe a higiene em dia (?). Disse-me que não se dá com um familiar próximo e por isso só lhe resta dormir na rua. O Rui não lê Zizek. Não faz política. Nem sequer é um desses radicais que anda por aí na rua em protesto por tudo e por nada. O Rui não sabe que Loulé é uma cidade candidata à internacionalização famosa através do desporto. O Rui não sobrevive a andar de bicicleta e nem a sua dignidade deveria ser vandalizada pela caridade. O Rui é, neste momento, um Sem-Abrigo em Loulé. Sem voz, o Rui ficou na parte de trás dos que ficaram para trás. Na rua, com uma mantinha.
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