Foram publicados este fim de semana em alguns jornais nacionais os rankings sobre as escolas portuguesas do ensino básico e secundário. Mesmo contextualizados com variáveis inerentes ao contexto socioeconómico dos alunos e portanto menos vulneráveis a uma leitura manipulada dos dados do que uma redutora análise a partir apenas dos resultados dos exames nacionais; os rankings escolares não deixam de evidenciar brutalmente o papel da escola na reprodução e na legitimação das desigualdades educativas e sociais. Nos lugares cimeiros dos rankings lá estão maioritariamente as escolas privadas enquanto nos últimos lugares predominam as escolas públicas de composição social constituída por públicos desfavorecidos provenientes de famílias com menor capital económico e cultural. Sendo necessário uma análise atenta à complexidade das situações que fogem a esta tendência dominante, nomeadamente as escolas que surpreendem pelos bons resultados onde não seria de esperar e as escolas que ficam abaixo dos valores esperados, a divulgação destes resultados podem produzir efeitos a partir da percepção pública constituída no sentido daquelas que foram algumas das principais críticas às teorias da reprodução social. Por um lado, a associação por directores de escolas, pais e professores de que os piores resultados estão associados a alunos e famílias de contextos sócio-económicos desfavorecidos pode levar à ideia de uma fatalidade social à qual as escolas não podem responder assente na teoria das "carências sócio-culturais". A ideologia seria aqui a de que a escola é impotente para colmatar aquilo que os alunos e as suas famílias não têm e portanto, não se peça à escola para mitigar as desigualdades sociais. Por outro lado, a associação entre escolas privadas e melhores resultados nos rankings pode levar à ilusão da "ideologia do dom" ou seja, a ideia de que os bons resultados se devem ao esforço e mérito destes alunos ignorando-se a composição social favorecida dos seus públicos, factor essencial este no resultado final produzido pelos alunos e suas escolas. Se no primeiro caso, a teoria dos "défices" pode servir de mecanismo desculpabilizador do papel dos professores, da gestão e da organização dos contextos escolares e das próprias políticas educativas na fabricação social de desigualdades sociais, no segundo caso é o mecanismo inverso que pode acontecer, a ideologia meritocrática assente na ideia do dom pessoal servir para fazer esquecer a forma como a escola é o contexto ideal para a fabricação da ilusão meritocrática transformando o privilégio em virtude. Era bom que não se deixasse esta discussão ao bom senso comum de cada um dos intervenientes neste debate e muito menos por conta dos economistas neoliberais de serviço nos media.
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